sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

O Brasil entre o confronto e o diálogo

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte
Francisco Borba Ribeiro Neto, 
coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

A grande piada nesta virada do ano foi que 2016 não era um novo ano, mas o retorno de 2015 estropiado. As notícias do governo, da Lava Jato e agora da Zelotes, dos congressistas em recesso parlamentar, parecem confirmar a piada. Já os atuais protestos de rua fazem pensar também no retorno de um 2013 desnorteado.
Debates, ações policiais capturando corruptos e protestos nas ruas não são obstáculos à democracia. Pelo contrário, são sinais de vitalidade democrática, de uma nação que procura se livrar dos erros do passado e caminhar para o futuro.
Obstáculo para o futuro é a falta de perspectiva política, que faz com que os principais atores políticos se engalfinhem (até literalmente) para nada, pois nenhum dos lados têm propostas relevantes para superar a crise. Obstáculo é a eterna rusga entre PT e PSDB, mais preocupados em denegrir um ao outro do que em propor soluções (e agora, ao invés de tucanos em cima do muro, parece que temos urubus de outros partidos esperando a carniça). Obstáculos são políticos e militantes preocupados em condenar adversários e absolver partidários e não em ver feita a justiça (que deveria ser dura para os culpados e doce para os inocentes de ambos os lados).
Obstáculos não estão em jovens manifestando-se e protestando. A médio e longo prazo seria pior uma geração alienada e apática, esperando não se sabe o quê. Obstáculos surgem quando as polícias não sabem ou não conseguem manter a ordem pública nestes protestos, quando umas centenas de manifestantes se imaginam no direito de depredar o patrimônio dos outros e mesmo o público, ou de atrapalhar a vida de milhões (incluindo aí os pobres que querem defender, pois os ricos são sempre os menos afetados por qualquer problema urbano).
Parece que as lideranças brasileiras – sejam quais forem – não ouviram as palavras que o Papa Francisco dirigiu a elas, durante a JMJ (em 27/07/2013). Ele insistiu na necessidade do diálogo para a superação dos problemas sociais. Mas o que mais se vê no Brasil de hoje são confrontos estéreis que não conduzem a nada. Os caminhos propostos pelas partes são insatisfatórios e precisam ser revistos para contemplar também as necessidades apresentadas pelos demais grupos.
A primeira exigência para o diálogo é a justiça. Em países com longo histórico de conflitos internos, como a Colômbia, os que lutam pela paz sabem que as partes precisam fazer concessões e perdoar, mas a realização da justiça é o primeiro passo para a conciliação. O Brasil encontra-se num momento de inflexão na luta contra a corrupção. As coisas não podem acabar em pizza, mas para isso nem a impunidade, nem o revanchismo ou a raiva podem dar a última palavra.
O diálogo exige sempre, porém mais ainda neste momento, responsabilidade social e um olhar realista diante dos problemas. Não se pode querer que um Estado em crise financeira “fabrique dinheiro do nada” ou que uma nova ordem política e social aconteça simplesmente porque as coisas vão mal. As duas hipóteses já foram tentadas em nossa história – e só pioraram a situação. Por outro lado, não se pode ignorar a ultrajante sensação de dignidade ferida que o povo vive ao saber que terá de apertar o cinto por conta de erros políticos, técnicos e até morais de uns poucos.
Justiça, realismo e responsabilidade social são as condições para a credibilidade e o diálogo. Credibilidade e diálogo são as condições para sairmos da crise. É o momento das organizações sociais, como associações, sindicatos, universidades, igrejas, colocarem sua credibilidade a serviço do diálogo em todos os níveis.
Jornal "O São Paulo", edição 3086, 28 de janeiro a 2 de fevereiro de 2016.

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